segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Penedo - 25/01/2008

Penedo me fez lembrar Ouro Preto, em Minas Gerais. Acabei lendo que era considerada a Ouro Preto alagoana em um jornal, posteriormente. Uma cidade cheia de ladeiras, coqueiros, chuva, rio açoriado, casas típicas e arquitetura de 1700 a 1900. Em cada cantinho, respirava-se um pouco de história. Conseguimos nos hospedar na Pousada do Ribeirinho. Esse dia, mandei a Maíra procurar.

Arquitetura de 1700, 1800 e 1900. Nos anos 50 e 60, a cidade sediava o festival internacional de cinema, hoje realizado em Gramado.

Durante a viagem, configuramos uma divisão de funções. Em geral, eu era quem procurava hospedagem, enquanto ela esperava com as mochilas em alguma sombra. Enquanto ela procurava, passaram dois mochileiros. Conversei com eles. Franceses. Sabiam que o rio São Francisco era o segundo rio mais importante do país. Creio que poucos brasileiros sabem dessa informação. Andando na chuva pela cidade, fomos descobrindo o charme daquele local. Nessa sexta-feira à noite, decidimos ir até o bairro de Toinho Pescador, um homem que a outra Maíra e o trio de estudantes nos recomendaram conversar. Na caminhada até o bairro, encontrei um homem que confeccionava bonecos gigantes e toda classe de bonecos. Tinha um ar de importante. Explicando: usei o truque do "ler alto o nome escrito em letras de Itú" quando entrei no ateliê do homem. Ele se sentiu importante. E minha primeira pergunta foi: "o senhor sabe onde é a casa de Toinho Pescador?". Conversamos um tempinho com o fulano dos bonecos. De fato, ali era uma terra de artistas. Caminhando até a casa de nosso procurado, mais artistas se manifestavam no interior de suas casinhas. Encontramos a casa de Toinho facilmente. Todos o conheciam. Seu bairro era um bairro industrial antigamente. Era um bairro periférico. Sua mulher estava em casa e nos recebeu. Contou-nos que trabalhou na fábrica e da luta de criar os mais de 10 filhos. Toinho não estava. Demos uma volta pelo bairro e voltamos para esperá-lo. Quando chegou, nos recebeu bem. Um negro velho contador de histórias. Um homem simples. Pescador há anos. Um poeta. Proclamou duas poesias para nós. Um militante. Contou-nos que sua luta pelo rio começou há muitos anos, pelo incentivo de um bispo que auxiliava o povo a sobreviver. Atualmente, Toinho é uma referência inquestionável sobre qualquer coisa que se diga sobre o rio. Um bom marido. Contou-nos que quem o incentivou ao ativismo foi sua mulher. Achei lindo esse companheirismo entre eles. Um homem digno. Foi pescador e criou todos os filhos com a força de seus braços no rio. Inteligente. Articulava o discurso de maneira simples e profunda. Um homem de Deus. Fé e perseverança eram seus lemas. Rio São Francisco vivo: terra, água, rio e povo. Sai de lá com uma leveza na alma. Sua última pergunta para nós foi sobre militância. Disse-lhe que essa viagem não foi em favor de nenhum movimento. Havia sido a maneira que encontramos de conhecer melhor o rio, o povo e as opiniões sobre a transposição. Aquilo tudo me fez refletir sobre meu papel na luta pela vida ao longo do rio. Cheguei à conclusão que o alcance e limite de minha atuação era a de um turista, que ao viajar ao longo do rio, trazia para as pessoas próximas a lembraça de sua existência. E isso é muita coisa, apesar de, paradoxalmente, não ser nada ao mesmo tempo. Se todas as pessoas fossem fazer uma viagem a um trecho do rio, tenho certeza que ele estaria bem diferente atualmente. Por isso mesmo que me dei conta de uma transformação pela qual estou passando. Antigamente eu teria levantado bandeiras, encarado debates, enfrentados críticas e vociferado jargões politizados. Hoje, dou-me conta que o protesto é necessário, mas há diferentes formas de fazê-lo. Decidi ser uma pessoa pacífica. Portanto, essa viagem pelo rio São Francisco foi uma forma pacífica de atrair a atenção para as questões que circulam a seu redor.

Centro de Penedo.

Sábado fomos andar mais um pouco pela cidade. Algumas pessoas diziam que em Sergipe, mais precisamente em Neópolis, haveria uma prévia de carnaval, com muito frevo. Fomos até o porto e pegamos carona com a balsa e com um ônibus. Nos deixaram no centro da cidade. Era apenas boato. Não havia nada ali. Após um descanso, pagamos a lancha-circular e voltamos a Penedo. Sábado à noite e a cidade completamente vazia. Não havia praticamente ninguém na rua. Uma cena engraçada: na beira do rio, há um bar chique. Queríamos comer macaxeira frita. Eu, com minhas roupas sujas, fui perguntar da iguaria ao garçon. O moço, gentilmente, me disse que ali não havia tal alimento e que, talvez, eu acharia em outro lugar, mais simples. Foi a única pessoa na viagem que olhou para mim e identificou a necessidade do cliente. Bom esse cara. Após a frustração de um Sábado à noite monótono, decidimos seguir viagem para a última cidade na beira do rio São Francisco.

Nenhum comentário: